Funcionário público é alvo das construtoras

As construtoras que atuam na baixa renda estão atrás do bom pagador. Para garantir o recebimento das prestações, já tem até empresa que vende apartamento com cartão de crédito. O próximo passo é aderir ao crédito consignado (com desconto na folha de pagamento). O cliente com renda garantida e de fácil aprovação na Caixa Econômica Federal - leia-se funcionários públicos de todos os tipos - é o novo filão do mercado imobiliário.

A Cury, empresa que atua na construção popular e que tem 50% do capital nas mãos da líder de mercado Cyrela, é a mais adiantada na busca de novas parcerias. Fechou um acordo com os servidores públicos de Guarulhos - um grupo de 18 mil funcionários, entre aposentados e ativos - que tiveram desconto de 5% e prioridade na compra de um empreendimento de 2,3 mil unidades, o maior projeto do Minha Casa, Minha Vida.

Agora, está perto de assinar com a prefeitura de Mogi das Cruzes - onde estuda o desconto direto na folha de pagamento - e está em negociação com o sindicato dos professores do Estado de São Paulo (Apeoesp) e Associação dos Policiais Militares de São Paulo (Adepom). "São excelentes clientes. É bom para nós e para a Caixa Econômica Federal", afirma Fabio Cury, presidente. Há uma vantagem adicional: o estreitamento da relação com as prefeituras e a possibilidade de aprovação mais rápida de projetos.

A Tenda, que será incorporada pela Gafisa, também quer o nicho dos funcionários públicos. Depois de fechar parceria com a Casas Bahia para a venda de imóveis na principal loja da rede, há mais de dois meses está negociando um acordo com a associação dos funcionários de um grande banco.

Ainda nessa linha da garantia do recebimento, a Cury também costurou uma parceria com a Visa para pagamento da entrada do imóvel em até dez vezes sem juros. O cliente tem a vantagem de usar o limite do cartão para compor a renda na aquisição da casa própria, além de poder dividir a entrada (de cerca de R$ 4 mil para um apartamento de R$ 90 mil) em dez vezes, em vez das seis parcelas pagas diretamente à construtora.

Para a empresa, é um excelente negócio. Isso porque, depois de seis meses do início do pagamento da entrada - período que pode ser maior, dependendo da agilidade e da capacidade de análise da Caixa - o cliente é desligado e repassado para o banco estatal. Mas há um período em que as parcelas da entrada coincidem com o financiamento bancário. E, uma vez que o cliente é desligado, a garantia (imóvel) passa a ser da Caixa Econômica Federal. "Nós perdemos a força, quando há o repasse do cliente, porque eu escrituro o imóvel", diz Cury.

Embora o aumento da penetração do cartão de crédito nas classes C e D seja conhecido, Cury se disse surpreso. "Todo mundo tem cartão", diz. Segundo ele, o limite normalmente é de 30% acima da renda e metade já está comprometida. "Estou atrás da outra metade", afirma.

Ter um bom pagador na carteira não significa apenas conseguir receber a entrada, mas também a garantia de repasse desse cliente para a Caixa - um dos grandes temores do setor. Na opinião do analista do Fator, Eduardo Silveira, o desligamento dos clientes das empresas para a instituição é uma fase que ainda não começou e pode ser um gargalo do setor.

A dificuldade de repasse de clientes para os bancos está vindo a público agora. No fim do ano passado, durante a crise, as instituições financeiras ficaram mais restritivas no repasse, segundo empresas do setor, e algumas construtoras tiveram problemas que aparecem nos balanços.

Na última divulgação de resultados, a Rodobens Negócios Imobiliários disse que "a recusa do principal agente negociador em aceitar o 'behavior' como premissa de análise de crédito, apesar do acordo firmado, gerou desistência em algumas unidades concluídas e fez com que parte da receita já reconhecida de alguns empreendimentos fosse estornada." Trata-se do Banco Real Santander.

Pelo "behavior", comportamento em inglês, o cliente tem que provar que tem capacidade de pagamento por 12 meses, é aceito o atraso de uma parcela por até 60 dias ou duas parcelas por 30 dias. Sem conseguir repassar a carteira, a empresa teve problemas de receita, que caiu 40% em relação so segundo trimestre, que refletiram no lucro líquido, que recuou 85%, apesar do aumento de 8% nas vendas. Procurada, a Rodobens informou que está retomando as operações e que a metodologia de "behavior" voltou a ser aceita.

Fonte: Valor Econômico

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